olhei pra trás com saudade mas sem nostalgia, deixei as ondas me baterem e pedi paz de espírito.
recolhi os meus pedaços, olhei os machucados que ardiam quando eu me movia...levantei, sequei as lágrimas que ainda corriam e fiquei em pé...senti que carregava o mundo nas costas pelo peso dos meus ombros...pensei em tantas coisas que senti uma ligeira vertigem...era um sonho...abri os olhos e estava deitada na minha cama, os meus olhos mal ficavam abertos depois de tanto choro, o travesseiro ainda estava molhado e guardava todos os segredos daquelas lágrimas...sentia frio, medo...mas era preciso levantar-me...por obrigação fiquei em pé...busquei alguma razão pra estar ali, mas não encontrei...me sentia uma alma perdida...um corpo apenas.
lembrei-me da infância e senti saudades, lembrei-me dos sonhos e da inocência...lembrei-me de acreditar que um dia poderia ser real, senti raiva por enganar a mim mesma.
alguns me chamam de pessimista, prefiro me definir como realista.
não é que não tenha sonhos, mas prefiro que eles se mantenham assim visto por mim como coisas inalcançaveis, desta forma me machuco menos, me afundo menos.
vago pelas ruas desertas...hoje ouvi alguém perto perguntar...como se vive tão na solidão?....respondi...acostuma-se!
vi seus rotos ficarem um pouco chocados com a minha resposta...respirando fundo e engolindo o choro continuei...acostuma-se! um dia você está em crise, chora, sente dor, mas no outro levanta-se e não se importa com o vazio ocupado sempre pela solidão.
ser solitário é andar com a própria sombra, é dividir o riso, o choro, o medo, a angustia com a própria solidão.
Assusta e muito, mas aprende-se a viver, ou melhor, levar a vida. Cola-se os pedaços da alma todos os dias, cada dia um pedaço novo, cada pedaço um novo dia.
As vezes se esconder é o melhor caminho, se proteger de si mesmo é sempre a melhor opção, não pular do abismo pra não se ter que fechar grandes feridas depois...essa é a escolha e ao mesmo tempo o castigo, a sentença de morte e o medo dela também.
guardei os sonhos mais impossíveis na caixinha, tranquei com chave como se assim esperasse que evitasse a fuga não foi possível... lembranças, papeis recortados, personagens, desejos, planos...tudo ficou guardado por tantos anos que quando abri a caixinha não estavam mais lá.
senti uma tristeza enorme por perceber que envelheci...fechei a caixinha novamente, dessa vez sem o cuidado de passar a chave, sequei as lágrimas, respirei fundo e achei que seria mais fácil agora que sabia que eles haviam se perdido continuar em pé, firme e fria como um pedaço de gelo...não está sedo tão fácil assim, mas um pouco menos doloroso...não ficaram marcas...parti.